lisbon new-yorker: abençoada menstruação

Um dia destes acordei mal disposta. Doía-me a cabeça, o estômago estava embrulhado, as costas doridas…e não, isto não era uma ressaca. Era aquele bichinho querido que aparece todos os meses para nos infernizar a nossa já infernal vida. Não chega termos de usar roupa apertada, de sofrer com dores nos pés quando vamos sair à noite, não poder chorar no cinema para não borrar o rímel. O que nos faz mesmo falta é um fluxo sanguíneo, que nos visita mensalmente e que nos deixa insuportáveis para quem nos rodeia e que torna tudo insuportável à nossa volta.

Quando tinha onze anos fui, pela primeira vez, galardoada com esta maravilha chamada menstruação.

- Parabéns, filha! Já és mulher! - disse a minha mãe com os olhos repletos de lágrimas.

- Parabéns?? - respondi eu, revoltada. Estou a sangrar, apetece-me vomitar, tenho dores em todo o lado e tu dás-me os parabéns?

Nessa altura percebi que a vida simples e feliz tinha acabado. Entrava agora numa nova era, que duraria décadas e que me obrigaria a planear toda a minha vida em torno “daqueles dias do mês”. Tinha crescido, assim de um dia para o outro, só porque sim e, sem explicação aparente, novos acessórios começavam a desabrochar do meu corpo. Pêlos e maminhas, principalmente.

Quis morrer, fazer um ensaio trágico da minha própria morte, imaginando o padre a proclamar no funeral “Filipa, a menina que nos deixou porque era demasiado complicado ser mulher”. Desisti, achei que devia pelo menos tentar adaptar-me à minha nova condição de adulta, até porque planear um funeral sem morto começou a revelar-se uma missão impossível. Porém, em pouco tempo, viria a perceber que outro desafio mais complexo me esperava.

11h00 da manhã – Num supermercado qualquer, secção de higiene, sub-secção de higiene feminina. Diante de mim estava uma estante gigantesca cheia de pacotes de coisas estranhas. Pensos diários, pensos com abas, pensos tanga, tampões de várias classes. Fiquei sem perceber porque é que não me tinham obrigado a fazer uma licenciatura em pensos e companhia. Do que é que interessava saber o percurso do bolo alimentar, ou conhecer a fundo os Descobrimentos quando nem conseguia escolher uma porcaria de um penso? Este é o nosso sistema de ensino, minhas senhoras! Aprendemos tudo menos aquilo que me parece ser indispensável à sobrevivência feminina.

Ainda hoje, passados 12 anos desse dia fatídico em que virei mulher contra a minha vontade, me sinto confusa quando tenho de adquirir, por força das circunstâncias, produtos de auxílio à menstruação. Actualmente, a indústria do penso e do tampão é um mundo. Percorrendo a prateleira dos pensos posso encontrar propostas tão apelativas como pensos com odor a aloé vera, pensos perfect fit, pensos com extractos de algodão natural, pensos flexiform, tampões silk touch. Realmente a vida parece bela quando se passeia com um penso com extractos de algodão natural. Todos os problemas se dissipam por causa daquele rectângulo sintético que temos entre as pernas. Obrigada Senhor por esta bênção!

Mas isto não fica por aqui. Já repararam que, num rasgo de loucura permanente, todas as marcas decidiram pintar as embalagens de pensos de cores fluorescentes? Quer dizer, uma pessoa já se sente infeliz e doente e ainda tem de afirmar a todas as pessoas que encontra nos corredores da superfície comercial “Olhem para mim, estou com o período!”. Eu sei que a imagem de uma mulher a jorrar sangue é sexy mas por favor!!